Espera excessiva em filas gera dano moral?

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) não dispõe acerca de norma limitando o tempo de espera em instituições bancárias. No entanto, há diversos Municípios que estabeleceram um limite em suas legislações locais a fim de regular a questão.

Nesses diplomas normativos prevê-se o tempo máximo médio de espera por atendimento entre 15 (quinze) a 40 (quarenta) minutos, sendo que o desrespeito a tais limites configura infração administrativa, sancionável com multa e outras penalidades, tais como a advertência por escrito, a suspensão de alvará de funcionamento e a duplicação do valor da multa.

Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local, notadamente sobre a definição do tempo máximo de espera de clientes em filas de instituições bancárias. (STF. Plenário. RE 610221 RG, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 29/04/2010. Repercussão Geral – Tema 272).

É constitucional lei municipal que estabelece que os supermercados e hipermercados do Município ficam obrigados a colocar à disposição dos consumidores pessoal suficiente no setor de caixas, de forma que a espera na fila para o atendimento seja de, no máximo, 15 minutos. Isso porque compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local, notadamente sobre a definição do tempo máximo de espera de clientes em filas de estabelecimentos empresariais.

Vale ressaltar, contudo, que a mera alegação de perda de tempo útil não é suficiente, por si só, para justificar reparação cível, como pretende o recorrido, porque não serve de parâmetro exclusivo para tanto.

O fator decisivo para definição da existência de prejuízo indenizável é a regra da experiência e as nuances fáticas, aplicáveis também às relações de consumo, cuja responsabilidade é em regra objetiva, assim como o preenchimento dos pressupostos basilares da conduta, do dano e do nexo de causalidade entre eles.

O atraso em virtude de uma fila, por si só, não tem o condão de ofender direito de personalidade do consumidor dos serviços bancários.

O mero transcurso do tempo, por si só, não impõe um dever obrigacional de ressarcimento, por não configurar, de plano, uma prática abusiva a acarretar uma compensação pecuniária, como pressupõe a teoria do desvio produtivo, que considera a perda de tempo útil uma espécie de direito de personalidade irrenunciável do indivíduo. Sob tal perspectiva, qualquer atraso na prestação de serviços poderia atrair a tese. Contudo, o controle do tempo, por mais salutar que seja, depende de fatores por vezes incontroláveis e não previsíveis, como parece óbvio. Há atendimentos mais demorados que não são passíveis de fiscalização prévia e, por vezes, até mesmo eventos de força maior, que podem ensejar atrasos.

Em suma, o simples descumprimento do prazo estabelecido em legislação específica para a prestação de serviços bancários não gera por si só dano moral in re ipsa. (STJ. 2ª Seção. REsp 1.962.275-GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 24/4/2024. Recurso Repetitivo – Tema 1156 – Info 809).

É necessário que, além do ato ilícito, estejam presentes também o dano e o nexo de causalidade, tendo em vista serem elementos da responsabilidade civil.

Abaixo outros precedentes sobre a questão:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ESPERA EM FILA DE BANCO POR MAIS DE UMA HORA. TEMPO SUPERIOR AO FIXADO POR LEGISLAÇÃO LOCAL. INSUFICIÊNCIA DA SÓ INVOCAÇÃO LEGISLATIVA ALUDIDA. PADECIMENTO MORAL, CONTUDO, EXPRESSAMENTE ASSINALADO PELA SENTENÇA E PELO ACÓRDÃO, CONSTITUINDO FUNDAMENTO FÁTICO INALTERÁVEL POR ESTA CORTE (SÚMULA 7/STJ). INDENIZAÇÃO DE R$ 3.000,00, CORRIGIDA DESDE A DATA DO ATO DANOSO (SÚMULA 54/STJ).
1.- A espera por atendimento em fila de banco quando excessiva ou associada a outros constrangimentos, e reconhecida faticamente como provocadora de sofrimento moral, enseja condenação por dano moral.
2.- A só invocação de legislação municipal ou estadual que estabelece tempo máximo de espera em fila de banco não é suficiente para desejar o direito à indenização, pois dirige a sanções administrativas, que podem ser provocadas pelo usuário.
3.- Reconhecidas, pela sentença e pelo Acórdão, as circunstâncias fáticas do padecimento moral, prevalece o julgamento da origem (Súmula 7/STJ).
4.- Mantém-se, por razoável, o valor de 3.000,00, para desestímulo à conduta, corrigido monetariamente desde a data do evento danoso (Súmula 54/STJ), ante as forças econômicas do banco responsável e, inclusive, para desestímulo à recorribilidade, de menor monta, ante aludidas forças econômicas.
5.- Recurso Especial improvido.
(REsp 1218497/MT, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/09/2012, DJe 17/09/2012)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC/73) – AÇÃO CONDENATÓRIA – ESPERA EM FILA BANCÁRIA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. IRRESIGNAÇÃO DO AUTOR.
1. A mera invocação de legislação municipal que estabelece tempo máximo de espera em fila de banco não é suficiente para ensejar o direito à indenização. Precedentes.
2. Conforme entendimento jurisprudencial desta Corte a demora no atendimento em fila de banco, por si só, não é capaz de ensejar a reparação por danos morais, uma vez que, no caso dos autos, não ficou comprovada nenhuma intercorrência que pudesse abalar a honra do autor ou causar-lhe situação de dor, sofrimento ou humilhação. Incidência do óbice da súmula 7/STJ no ponto.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp 357.188/MG, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 03/05/2018, DJe 09/05/2018)

RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. TEMPO DE ATENDIMENTO PRESENCIAL EM AGÊNCIAS BANCÁRIAS. DEVER DE QUALIDADE, SEGURANÇA, DURABILIDADE E DESEMPENHO. ART. 4º, II, “D”, DO CDC. FUNÇÃO SOCIAL DA ATIVIDADE PRODUTIVA. MÁXIMO APROVEITAMENTO DOS RECURSOS PRODUTIVOS. TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR. DANO MORAL COLETIVO. OFENSA INJUSTA E INTOLERÁVEL. VALORES ESSENCIAIS DA SOCIEDADE. FUNÇÕES. PUNITIVA, REPRESSIVA E REDISTRIBUTIVA. 1. Cuida-se de coletiva de consumo, por meio da qual a recorrente requereu a condenação do recorrido ao cumprimento das regras de atendimento presencial em suas agências bancárias relacionadas ao tempo máximo de espera em filas, à disponibilização de sanitários e ao oferecimento de assentos a pessoas com dificuldades de locomoção, além da compensação dos danos morais coletivos causados pelo não cumprimento de referidas obrigações.
2. Recurso especial interposto em: 23/03/2016; conclusos ao gabinete em: 11/04/2017; julgamento: CPC/73.
3. O propósito recursal é determinar se o descumprimento de normas municipais e federais que estabelecem parâmetros para a adequada prestação do serviço de atendimento presencial em agências bancárias é capaz de configurar dano moral de natureza coletiva.
4. O dano moral coletivo é espécie autônoma de dano que está relacionada à integridade psico-física da coletividade, bem de natureza estritamente transindividual e que, portanto, não se identifica com aqueles tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico), amparados pelos danos morais individuais.
5. O dano moral coletivo não se confunde com o somatório das lesões extrapatrimoniais singulares, por isso não se submete ao princípio da reparação integral (art. 944, caput, do CC/02), cumprindo, ademais, funções específicas.
6. No dano moral coletivo, a função punitiva – sancionamento exemplar ao ofensor – é, aliada ao caráter preventivo – de inibição da reiteração da prática ilícita – e ao princípio da vedação do enriquecimento ilícito do agente, a fim de que o eventual proveito patrimonial obtido com a prática do ato irregular seja revertido em favor da sociedade.
7. O dever de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho que é atribuído aos fornecedores de produtos e serviços pelo art. 4º, II, d, do CDC, tem um conteúdo coletivo implícito, uma função social, relacionada à otimização e ao máximo aproveitamento dos recursos produtivos disponíveis na sociedade, entre eles, o tempo.
8. O desrespeito voluntário das garantias legais, com o nítido intuito de otimizar o lucro em prejuízo da qualidade do serviço, revela ofensa aos deveres anexos ao princípio boa-fé objetiva e configura lesão injusta e intolerável à função social da atividade produtiva e à proteção do tempo útil do consumidor.
9. Na hipótese concreta, a instituição financeira recorrida optou por não adequar seu serviço aos padrões de qualidade previstos em lei municipal e federal, impondo à sociedade o desperdício de tempo útil e acarretando violação injusta e intolerável ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos, o que é suficiente para a configuração do dano moral coletivo.
10. Recurso especial provido.
(REsp 1737412/SE, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/02/2019, DJe 08/02/2019)

FONTE DE PESQUISA: DIZER O DIREITO – INFORMATIVO COMENTADO N. 809 DO STJ. Disponível em: info-809-stj.pdf (dizerodireito.net) (Acesso em 13/06/2024).